quarta-feira, 25 de abril de 2018

Franquia para Planos de Saúde? Há outras pendências para as operadoras...

Os sistemas de atenção à saúde no Brasil são, em sua maior parte, fragmentados, reativos, episódicos, focados na doença e organizados com base no fortalecimento do atendimento em unidades de urgência e nos cuidados de nível secundário. Os problemas ocorrem tanto na infraestrutura quanto na gestão, tanto no sistema público quanto no privado. Estudos conduzidos pelo Banco Mundial em 2009 reprovaram uma parcela significativa dos hospitais brasileiros, públicos e particulares, apontando que o setor gasta mal e desperdiça muito. No estudo “Desempenho hospitalar brasileiro”, a rede de hospitais avaliados obteve nota 0,34 numa escala de 0 a 1. Segundo a instituição, mais de 30% das internações seriam desnecessárias, o que geraria desperdício de R$ 10 bilhões por ano. A assistência privada, diferentemente do sistema público, não é universal nem gratuita. Não existe uma relação direta de causa e efeito entre o aumento dos custos da saúde e o aumento da qualidade dos serviços prestados e da tecnologia empregada.

O país ainda enfrenta uma rápida mudança demográfica e epidemiológica caracterizada pelo envelhecimento da população e por uma impressionante carga de doenças. Ainda não superamos as infecções decorrentes dos problemas sanitários, convivemos com a alta prevalência das lesões secundárias aos traumas (violência e acidentes) e já temos que lidar com as doenças crônicas próprias do envelhecimento populacional.

Do ponto de vista do usuário, a insatisfação é generalizada tanto com os serviços de saúde públicos quanto com os suplementares. Em pesquisa recente conduzida pelo Instituto Datafolha, 45% dos entrevistados apontaram a saúde como principal problema do país, à frente da violência, desemprego, fome, miséria e corrupção. O percentual da população insatisfeita com os cuidados triplicou em uma década, passando de 15% para 45%. Mais de 60% da população avalia a assistência como ruim ou péssima, e esse número cresce para 70% quando os entrevistados são somente os que têm acesso ao sistema privado. Notadamente, as principais causas da insatisfação são a sensação da falta de médicos e enfermeiros e a da baixa qualidade do atendimento. A maior parte da população entrevistada (66%) considera que o acesso aos serviços de saúde no Brasil é difícil ou muito difícil. Paradoxalmente, os médicos são percebidos como os profissionais mais confiáveis (26%), seguidos por professores (24%) e bombeiros (15%).

O gasto de um país com saúde em relação a seu PIB não revela necessariamente a eficiência do sistema. Os Estados Unidos são o país que mais gasta com saúde desse ponto de vista, 17,7% do PIB, mas sua população está longe de se considerar minimamente tranquila. Mais revelador é o gasto per capita. Por esse critério, o Brasil gastou US$ 1.109 em 2012, em paridade do poder de compra (PPP), de acordo com a ANAHP, ficando à frente apenas de seis países, dentre os quais o México (US$ 977), a China (US$ 432) e a Índia (US$ 141). Os Estados Unidos novamente encabeçam a relação com despesas per capita de US$ 8,9 mil. O Brasil só se aproxima dos Estados Unidos pelo elevado percentual de gastos com saúde do setor privado, em torno de 54% do total per capita nos dois casos. Cálculos da ANAHP sinalizam que o gasto privado com saúde pode ser ainda maior no Brasil, três vezes superior ao público, incluindo as despesas por parte da população que não possui plano de saúde, o que é uma contradição diante da proposta de universalização da saúde.

Para alguns especialistas, a população não deveria pagar mais do que 50% das despesas com saúde, e isso ocorreria para evitar as filas ou para procedimentos mais sofisticados como próteses. Ainda assim o percentual surpreende porque no Brasil a mão de obra médica é mais barata do que nos países mais avançados, enquanto o custo de equipamentos e materiais acompanha o patamar internacional.

Neste contexto, portanto, as operadoras de planos de saúde tem um grande desafio a ser enfrentado antes da simples tarefa de aumentar seu faturamento. Ainda há muito a evoluir em organização, gestão e qualidade dos serviços prestados, sobretudo na redução de custos. Cada vez mais são necessários gestores preparados e motivados para transformar o atual cenário nacional dos sistemas de saúde em busca da excelência na assistência prestada.

Fonte dos Dados: Harvard Business Review Brasil

quarta-feira, 18 de abril de 2018

Em tempos de redução de custos, os grandes hospitais ainda fazem sentido?

De suas origens humildes, como caridade para os pobres e necessitados que não podiam receber cuidados em casa, os hospitais evoluíram para instituições grandes, lucrativas, caras e repletas de tecnologia, no epicentro do universo da saúde. Quase toda comunidade tem pelo menos um hospital geral centralizado, e a maioria tem mais de um. Contudo, a assistência à saúde está mudando. Com o advento das novas tecnologias, o crescimento exponencial da saúde digital e virtual, e a implantação de equipamentos cada vez mais modernos para o ambiente ambulatorial, ou até para o próprio domicílio, surgiram novas oportunidades para mudar os sistemas de saúde vigentes. Partindo de um sistema grande, robusto e centralizado para um menor, mais prático e mais rápido.

Até recentemente, o cuidado centralizado em torno de um hospital fazia sentido. Sem registros eletrônicos das informações de saúde, era quase impossível para os profissionais de saúde compreender os cuidados de forma longitudinal ou coordenar os cuidados sem levar os pacientes a um local físico onde as informações pudessem ser organizadas com o uso de sistemas de gerenciamento de documentação arcaicos. Além disso, a hiperespecialização da medicina e a confiança frequente em tecnologia avançada, como imagens, lasers e agentes quimioterápicos, biológicos ou imunológicos caros, que exigem composição especializada em tempo real, exigiram um modelo financeiro que permitisse a agregação de altos custos fixos. Esta agregação acabou por encontrar no hospital um local perfeito para a sua instalação.

Entretanto, o modelo de assistência à saúde tradicional de um hospital como o "ápice" de atendimento, com uma única instalação centralizada que fornece todas as facetas do diagnóstico e do tratamento das doenças, desde o atendimento cirúrgico especializado até exames oftalmológicos de rotina e controle da pressão arterial crônica, deve ser questionado.

Nos EUA a taxa de utilização de serviços de saúde vem crescendo mais rapidamente do que o crescimento da população. Porém, apesar da proliferação de mega-hospitais (> 1000 leitos), a capacidade não está atendendo à crescente demanda por serviços. Hospitais de lá estão lutando para manter-se, com pacientes internados sendo tratados nos setores de emergência enquanto esperam a disponibilidade de leitos de internação nas enfermarias. Construir hospitais maiores, embora lucrativos no ambiente de pagamento por serviços, não é uma opção viável em modelos financeiros de compartilhamento de riscos. Além disso, estima-se que 1 de cada 25 pacientes hospitalizados desenvolva uma infecção hospitalar, o que é um risco um pouco pior do que a possibilidade de lesão ao saltar de bungee jumping.

Há boas razões para procurar novas formas de prestação de cuidados. O quadro econômico dos cuidados de saúde será revertido, com o lucro sendo direcionado para a manutenção da saúde das populações, e não apenas para o combate à doença. Procedimentos cirúrgicos, que representam a galinha dos ovos de ouro do lucro para os cuidados de saúde, podem realmente se tornar uma despesa. É desafiador, talvez impossível, que a maioria dos grandes hospitais, com altos custos fixos, se transforme em negócios ágeis e de baixo custo. Os modelos de assistência que serão bem sucedidos são aqueles que simplesmente não estendem o alcance do hospital, mas que começam a substituir inteiramente o hospital como o conhecemos.

Em um futuro não muito distante, os sistemas de saúde devem, e serão, pagos para manter as pessoas saudáveis ​​e fora do hospital, e não para procedimentos e internações. Hoje, o monitoramento remoto, wearables, dispositivos de comunicação sem fio mais rápidos, plataformas robustas de informações em saúde, recursos virtuais de visita de saúde, telemedicina e, eventualmente, inteligência prescritiva, tornam menos necessário que pacientes e médicos sempre interajam nas quatro paredes de um hospital ou clínica. Considerando que tal tecnologia anteriormente era reservada com a finalidade de prover cuidado nas áreas mais remotas, uma indústria inteira está aumentando o poder de “saúde móvel ” para conectar pacientes com prestadores de serviço.

No programa Hospital at Home (HaH) da Johns Hopkins, por exemplo, os pacientes são internados em suas próprias casas e não no hospital, e seus cuidados são gerenciados através do uso de monitoramento remoto avançado e telemedicina. Os pacientes só são elegíveis para o HaH se estiverem doentes o suficiente para necessitar de hospitalização. Os pacientes são ligados ao hospital por meio de tecnologia de monitoramento remoto e recebem visitas diárias de um médico e outros profissionais de saúde. Eletrocardiogramas, raios-x e ultrassonografias podem ser realizados no domicílio do paciente com o uso de tecnologias portáteis. Tais programas de assistência domiciliar representam uma mudança radical no cuidado dos pacientes, possibilitando o atendimento a partir do conforto da própria casa, evitando incontáveis ​​horas em um hospital, transporte para deslocamentos e os custos resultantes.

Da mesma forma, na University of Colorado Health, há uma unidade móvel de acidente vascular cerebral que é enviada diretamente para as residências dos pacientes em uma ambulância especializada equipada com um pequeno tomógrafo computadorizado, recursos para testes no local de atendimento e acesso virtual a um especialista em acidente vascular cerebral, permitindo assim o diagnóstico remoto rápido e a administração pré-hospitalar da terapia trombolítica. Embora ainda seja recente, dados de outros locais com unidades similares mostraram que o tempo de trombólise é reduzido em mais de 50% dos casos, sem diferença nos desfechos adversos. 

Portanto, com a crescente pressão para criar um sistema de saúde voltado para a excelência do cuidado, centrado no paciente e de menor custo, há necessidade de se implementar alternativas seguras para os cuidados hospitalares dispendiosos. Assim como a descentralização transformou criticamente outras indústrias, como a computação - por exemplo, a IBM criou os primeiros computadores pessoais para substituir mainframes complexos de um único local e a Apple projetou subsequentemente poderosos computadores portáteis; a reorganização dos cuidados de saúde está começando a tomar forma. A medida que entramos neste próximo passo na evolução dos cuidados de saúde, vale a pena lembrar que os hospitais eram no princípio um último recurso para aqueles que não podiam dar-se ao luxo de receber cuidados em casa.

Os hospitais não vão desaparecer tão cedo, nem deveriam. Embora eles continuem a desempenhar um papel fundamental como base do sistema de prestação de cuidados, o atendimento hospitalar não é o que o consumidor típico precisa. Ao desvincular os cuidados mais essenciais e básicos de internação dos cuidados críticos e complexos, e ao se apropriar da tecnologia para realocar recursos para a comunidade, as casas dos pacientes e a nuvem, podemos reimaginar a busca por atendimento de excelência.